Políticas Públicas, movimentos e alianças em prol da igualdade racial na educação
No último encontro do Curso Educação, Relações Raciais e Direitos Humanos, os/as participantes puderam refletir sobre os processos de luta engendrados pelo movimento negro nas três décadas passadas. Como sujeito dessa história, a mestre em Ciências Sociais Gevanilda Santos, diretora da Soweto Organização Negra, compartilhou suas experiências na construção desta ação política de combate ao racismo.
Eram anos conturbados e tensos e, assim como em outras partes do mundo, a juventude negra brasileira vinha sofrendo influências, exibindo novas formas de falar, vestir e protestar. As mobilizações, conta Gevanilda, surgiram em resposta aos mecanismos de exclusão social , sendo as as manifestações culturais – e também políticas- a alternativa que por si só representava
um protesto às precárias condições de vida e ao modelo racial vigente.
Tais transformações logo encontraram ressonância em grandes pautas do universo negro contemporâneo, como a luta norte-americana pelos direitos civis, as guerras de libertação dos povos africanos de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau e a luta contra o apartheid na África do Sul.
Em 1971, foi criado em Porto Alegre (RS) o Grupo Palmares, responsável pela realização do primeiro ato de repúdio à história do Brasil em homenagem a Zumbi. O coletivo propôs que o dia 13 de maio fosse considerado a data da falsa abolição – haja vista as desigualdades sociais entre negros e brancos – e que, portanto, em seu lugar o dia 20 de novembro, data do assassinato de Zumbi dos Palmares, deveria ser celebrado em homenagem a luta e resistência dos/as escravizados/as.
Ao mesmo tempo, nos bailes de discoteca chegavam as influências da música negra estadunidense, com a soul music e o funk, ambos com sua estética rebelde e irreverente que culminou no Rio de Janeiro com o ‘Black Rio’ e invadiu os grandes bailes paulistanos da Chic Show, Black Mad, Os Carlos, Clube da Cidade e outras equipes do gênero.
No Rio de Janeiro, em meados da década de 1970, o debate sobre a realidade do negro expandiu-se para o Centro de Estudos Afro-Asiáticos, a Universidade Federal Fluminense e o Grêmio de Arte Negra Escola de Samba Quilombo, sob a liderança de Antônio Candeia Filho. Na Bahia, ocorreu o mesmo processo. O bloco afro baiano Ilê Ayê, inaugurado em 1974, transformou-se na maior expressão da negritude com identidade étnica na cultura de matriz africana. Essa efervescência estimulou o surgimento de outros blocos afro, como o Olodum e o Araketu, e potencializou o afoxé mais tradicional – representado pelos Filhos de Gandhi –, criando uma nova onda musical, corpórea, literária e estética da negritude afro-reggae baiana. Assim, os principais elementos da raiz civilizatória das etnias djedje, ketu e angola se popularizaram.
Com um ato público que reuniu milhares de pessoas nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo para denunciar a discriminação sofrida por quatro atletas negros nas dependências do Clube Regatas Tietê e o assassinato de outro jovem negro, Robson Silveira da Luz, foi criado o Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial (MUCDR) em julho de 1978. Tal mobilização constituiu um grande desafio à ditadura, em tempos que manifestações populares eram duramente reprimidas pela polícia.
A mídia alternativa, com destaque para o Jornal Versus, também desempenhou papel decisivo na divulgação dos ideiais do MUCDR – que posteriormente passou a se intitular apenas Movimento Negro Unificado (MNU) – que contestava à democracia racial defendida pelos militares, denunciando a violência policial e a pobreza da população negra.
De acordo com Gevanilda, o MNU foi idealizado pelo Núcleo Negro Socialista, fundado no estado de São Paulo por universitários negros do eixo São Paulo-Campinas-São Carlos e por jornalistas que atuavam no Jornal Versus. Eles/as pretendiam aglutinar diversas minorias que sofriam discriminações: negros, mulheres, indígenas, entre outros. O que explica a sigla inicial MUCDR (Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial).
Para a socióloga, a história de luta das organizações negras é de longa duração e manifesta-se em várias esferas da sociedade, a exemplo das revoltas coloniais, as irmandades religiosas católicas, as campanhas abolicionistas, os clubes recreativos e culturais, os territórios de religiosidade de matriz africana, as escolas de samba, as academias de capoeira, os jornais e imprensa negra, afoxés e blocos afros, congos e congadas, cultura e estética rastafári, institutos de estudos e pesquisa, grupos, associações, ONGs, ou as denominadas entidades ou organizações negras, os órgãos antirracistas nos sindicatos, partidos políticos e instituições governamentais.
Entre os principais eixos de atuação dessas entidades, Gevanilda ressalta:
- Valorização da identidade cultural negra;
- Crítica ao sistema educacional e promoção da educação antirracista;
- Crítica aos órgãos de segurança pública e a violência policial;
- Denúncia da relação de gênero e raça machista e patriarcal e estímulo à auto-estima da mulher negra;
- Denúncia da desigualdade econômica no mercado de trabalho;
- Abertura de área de estudos epidemiológicos para a saúde da população negra;
- Respeito e auto-estima aos adeptos da religião de matriz africana;
- Orientação para a regularização fundiária das terras dos remanescentes de quilombos;
- Pesquisa acadêmica e/ou estatística com recorte de raça/cor;
- Políticas públicas com recorte de gênero e raça;
- Relações internacionais de luta e solidariedade na diáspora africana.
Panorama e resistência negra colonial
Quilombo dos Palmares – AL (1630 -1695), Irmandade Nossa Senhora dos Homens Pretos SP (1725), Irmandade do Rosário dos Homens Pretos – SP (1771), Inconfidência Baiana/ Revolta dos Alfaiates ou Revolta dos Búzios – BA (1798), Sociedade Protetora dos Desvalidos SPD BA (1832), Jornal O Homem de Cor – SP (1833), Revolta do Malês – BA (1835), Criação do Terreiro do Gantois – BA (1849), Lei Euzébio de Queiroz (1850), Lei do Ventre Livre (1871), Sociedade Beneficente e Cultural Floresta Aurora – RS (1872), Centro Abolicionista Acadêmico de São Paulo fundado por Luiz Gama (1880), Lei dos Sexagenários (1885), Lei Áurea (1888).
Panorama da resistência negra republicana
Clube Beneficente Cultural e Recreativo Jundiaiense “28 de Setembro” – SP (1897), Fundação da Escola de samba Deixa Falar – RJ (1908), Fundação da Tenda de Umbanda Nossa Senhora da Piedade RJ (1908), Revolta da Chibata – RJ (1910), Criação do Ilê Axé Opó Afonjá BA (1910), Clube 13 de Maio antigo Sociedade Beneficente Antonio Bento – SP (1910), Jornal Menelik – SP (1915), Lançamento de “Pelo telefone”, primeiro samba a ser gravado RJ (1916), Centro Cívico Palmares – SP (1916), Fundação da Escola de Capoeira Mestre Bimba – BA (1918), 918, Centro Cívico (literário) Cruz e Souza SC (1918), Jornal Clarim d’ Alvorada – SP (1924), Jornal Quilombo – RJ (1929), Grêmio Recreativo Cultural Social Escola de Samba Vai-Vai – SP – (1930);
Frente Negra Brasileira – SP, PE, BA, MG, ES, (1931), Legião Negra Socialista – SP (1932), Fundação da União Geral das Escolas de Samba RJ (1934), Escola de Samba Primeira de SP (1935), Associação de Empregadas Domesticas fundada por Laudelina de Campos Mello na cidade de Santos (1936), Escola de Samba do Lavapes SP (1937), Criação do Centro Esportivo de Capoeira Angola Mestre Pastinha (1941) BA, Fundação da Sociedade Beneficente e Recreativa São Jorge do Engenho Velho – Casa Branca – BA (1943) União dos Homens de Cor do Brasil RJ e RS (1943);
Teatro Experimental do Negro – RJ (1945), Convenção Nacional do Negro Brasileiro – SP (1945), Irmandades de Nossa Senhora do Rosário – MG (1946), Frente Negra Trabalhista – SP (1948), Grêmio Literário Cruz e Souza – MG (1948), União. Cultural. dos Homens de Cor – RJ (1948), Conferência Nacional do Negro – RJ (1949), Afoxé Filhos de Gandhi BA (1949), 1º Congresso do Negro Brasileiro – RJ (1950), Conselho Nacional das Mulheres Negras – RJ (1950), Teatro Popular Brasileiro fundado por Solano Trindade – RJ (1950), Renascença Clube – RJ (1951), Associação Cultural do Negro – SP (1954), Casa de candomble Fanti-Ashanti – MA (1954) Centro de Estudos Afro-Orientais da UFBa – BA (1959), Aristocrata Clube – SP (1961), Câmara de Comércio Afro-Brasileira – SP (1968), Equipe de Baile Chic Show – SP (1968), Centro de Estudos Africanos da USP – SP (1969);
Grupo Palmares – RS (1971), Grupo Evolução de Campinas/SP (1971), Centro de Estudos e Arte Negra (Cecan) – SP (1972), União das Escolas de Samba Paulistana UESP SP (1973 ) , Centro de Estudos Afro-Asiáticos Universidade Candido Mendes – RJ (1973), Bloco Afro Ilê Aiyê – BA (1974), Simba – Sociedade Brasil-África – RJ (1974), Instituto de Pesquisa das Culturas Negras IPCN – RJ (1975), Equipe de Baile Zimbabwe SP (1975), Instituto Brasileiro de Estudos Africanistas – SP (1975), Centro de Estudos Brasil-África (Cenba) – RJ (1975), Federação das Entidades Afro-brasileiras do Estado de São Paulo – SP (1975), Teatro Popular Solano Trindade Embu/SP (1975), Escola de Samba Quilombo RJ (1975), Grupo de Trabalho André / UFF RJ (1975), Jornal Versus-Seção “Afro-Latino-América” (12ª à 24ª edição) SP (1975), Revista Tição RS (1976), Núcleo Negro Socialista – SP (1977);
Panorama e resistência negra contemporânea
FECONEZU – Araraquara /SP (1978), Pastoral Afro Brasileira (1978), Bloco Afro Badauê BA (1978), Lançamento do primeiro volume dos Cadernos Negros – SP (1978), Grupo Negro da PUC – SP (1979), Centro de Cultura Negra do Maranhão (1979), bloco afro Olodum – BA (1979), Bloco afro Malê Debalê BA (1979), Quilombhoje Literatura – SP (1980), Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros IPEAFRO-SP (1980), Legião Rastafari – BA (1980), Movimento Cultural Filhos de JAH – RJ (1980), Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará CEDENPA (1980), Grupo União e Consciência Negra do Brasil – RJ (1981), Bloco Afro Muzenza BA (1982), Bloco afro Agbara Dudu RJ (1982), Agentes de Pastoral Negros do Brasil APNs – SP (1983), Nzinga Coletivo de Mulheres Negra – RJ (1983), Centro de Estudos da Cultura Negra Cecun – ES (1983), Núcleo Cultural Níger Okán – BA (1984), Grupo homossexuais negros Adê Dudu _ BA (1984), Centro Brasileiro de Informação e Documentação do Artista Negro CIDAN – RJ (1984), Grupo Trabalhos e Estudo Zumbi Tez – MS (1984), Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra – SP (1984) Sociedade Afro sergipana de Estudos e Cidadania – SE (1986), Núcleo de Estudos Negros NEN – SC (1986), Cecune – POA (1987), Instituto do Negro Padre Batista – SP (1987), Maria Mulher – Organização de Mulheres Negras – RS (1987), Núcleo de Consciência Negra na USP – SP (1987), Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro Brasileiro INTECAB – BA (1987), I Encontro de negros do sul/sudeste – RJ (1987), N’zinga - Coletivo de Mulheres Negras – RJ (1987), Centenário da Abolição (1988);
Lei Cao criminaliza o racismo (1988), Bloco Afro Oriashé – SP (1988), União de Negros pela Igualdade-Unegro – SP (1988), I Encontro Nacional de Mulheres Negras – RJ (1988), Geledés – Instituto da Mulher Negra – SP (1988), Fundação Palmares Minc – DF (1988), Centro de Articulação de Populações Marginalizadas CEAP – RJ (1989), Grupo Angola Janga – POA (1988), N’zinga – Coletivo de mulheres Negras de BH – MG (1988), Fundação Pierre Verger – BA (1989), Posse Sindicato Negro – SP (1989). Núcleo Cultural Força Ativa – SP (1989), Movimento Hip-Hop. Organizado – MH20 SP (1989), II Encontro de negros do Sul – Sudeste SP (1989), X Encontro de Negros do Norte Nordeste BA (1989), Instituto Palmares de Direitos Humanos – IPDH – RJ ( 1989), Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades Ceert – SP (1990), Casa de Cultura da Mulher Negra – Santos (1990), III Encontro de negros do Sul – Sudeste ES (1990), União dos Negros de Aracaju (1990), I Encontro Nacional de Entidades Negras ENEN – SP (1991) e fundação da CONEN;
Secretaria Extraordinária de Defesa e Promoção das Populações Negras – RJ (1991), Centro Nacional de Religiosidade e Africanidade Afro – Brasileiro CENARAB MG (1991), Soweto Organização Negra – SP (1991), Núcleo de Estudos Afro-brasileiros NEAFRO/PUC SP (1991), NEAB –UFSCar, Sociedade Comunitária Ecológica Cultural e Escola de Samba “Fala Negão” – SP (1992), Criola RJ (1992), Instituto Cultural Steve Biko BA (1992), Coordenadoria dos Assuntos da População Negra CONE – SP (1992), Educafro – Educação e Cidadania de Afro-descendentes e Carentes – SP (1993), Movimento dos pré-vestibulares para negros e carentes RJ (1993), SENUN ( BA) 1993, Grupo Cultural Afro Reggae RJ (1993), Posse Haussa SP (1993), Comissão Nacional de Combate à Discriminação Racial da CUT (1994), Malungus – Organização Negra – PB (1994), Tricentenário da morte de zumbi dos Palmares (1995), Primeira titulação de terra de quilombola em Oriximiná – Para (1995), Secretaria Nacional de Combate ao Racismo do PT (1995);
Instituto Sindical Interamericano Pela Igualdade Social (INSPIR) reúne CUT, CGT, FS, AFLCIO e ORIT –SP (1995), CEAFRO/UFBA 1995, Jornal IROHIN – DF (1996), NEINB Núcleo de apoio a pesquisa em estudos interdisciplinares sobre o negro brasileiro (SP) 1996, Oriashé Sociedade Brasileira de Cultura e Arte Negra –(SP)1996, Coordenação Nacional de Quilombos CONAQ (1996), Fala Preta! Organização de Mulheres Negras – SP (1997), Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-Brasileiros CEABRA – SP (1997);
Associação Pró-Falcêmicos Anemia falciforme – SP (1998), Frente Parlamentar em Defesa da Igualdade Racial (1999), Associação Cultural Reggae – SP (1999), Casa do HIP HOP Diadema/SP (1999), Fundação Centro de Referência da Cultura Negra – MG, 1999), Kilombo – Organização Negra do RN (2000), Associação Brasileira de Pesquisadores Negros PE (2000), Instituto de Mulheres Negras do Amapá – IMENA AM (2000) , Feriado Estadual Dia 20 de Novembro, RJ (2000).
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