Etmologicamente,
o conceito de raça veio do italiano razza, que por sua vez veio do latim ratio, que
significa sorte, categoria, espécie. Na história das ciências naturais, o
conceito de raça foi primeiramente usado na Zoologia e na Botânica para classificar
as espécies animais e vegetais. Foi neste sentido que o naturalista sueco, Carl
Von Linné conhecido em Português como Lineu (1707-1778), o uso para classificar
as plantas em 24 raças ou classes, classificação hoje inteiramente abandonada. ”Prof. Dr. Kabengele Munanga (USP)”.
Raça é um conceito
para categorizar diferentes populações de uma mesma espécie biológica desde
suas características físicas; é comum falar-se das raças de cães ou de outros
animais. Na antropologia, eram utilizadas várias classificações de grupos
humanos, conhecidos como "raças humanas", mas desde que começou-se a
usar os métodos genéticos para estudar populações humanas, essas classificações
e o próprio conceito de raças humanas deixaram de ser utilizados, persistindo o
uso do termo entre outras na política.
Raça humana é
normalmente uma classificação de ordem social, onde a cor da pele e origem
social ganham sentidos, valores e
significados distintos. As diferenças mais comuns referem-se à cor de pele,
tipo de cabelo, conformação facial e cranial, ancestralidade e, em algumas
culturas, genética.Algumas vezes utiliza-se o termo raça para identificar um
grupo cultural ou étnico-lingüístico, sem quaisquer relações com um padrão
biológico, e nesses casos pode-se utilizar termos como população, etnia, ou
mesmo cultura. O termo "raça" ainda é aceito normalmente para
designar as variedades de animais domésticos e animais de criação como o gado.
Raça e etnia não são
sinônimos, mas o conceito de raça é associado ao de etnia. Etnia é uma comunidade
humana definida por afinidades lingüísticas e culturais. A palavra etnia é
derivada do grego ethnos, que significa povo.
A diferença entre raça e etnia, é que etnia
também compreende os fatores culturais, como a nacionalidade, religião, língua
e as tradições, enquanto raça compreende apenas os fatores morfológicos, como
cor de pele, constituição física, estatura. A palavra etnia muitas vezes é
usada erroneamente como um eufemismo para raça. A língua é utilizada como fator
primário de classificação dos grupos étnicos, existe grande número de línguas
multi-étnicas e determinadas etnias são multi-língues. Os grupos étnicos
compartilham uma origem comum, e exibem uma continuidade no tempo, apresentam
uma noção de história em comum e projetam um futuro como povo. Isto se alcança
através da transmissão de geração em geração de uma linguagem comum, de
valores, tradições e, em vários casos, instituições.
Etnia significa grupo biológico e culturalmente
homogêneo. Do grego ethnos, povo que tem o mesmo ethos, costume, incluindo língua, raça,
religião, vestes, territórios ou não e outras significancias. O termo não é
sinônimo de raça, pois a palavra raça tem um sentido exclusivamente biológico. Um grupo étnico é um
grupo de indivíduos que têm uma certa uniformidade cultural, que partilham as mesmas tradições,
conhecimentos, técnicas, habilidades, língua e comportamento.
Alguns autores
afirmam que o termo etnia surgiu inicialmente em Israel, especificamente na
época retratada no Antigo Testamento da Bíblia, onde as pessoas seguidoras do
Judaísmo usavam o termo ethnos para descrever os que não eram
judeus. Etnia é uma expressão utilizada
também de forma pejorativa podendo revelar preconceito contra um determinado
grupo racial, ou para mostrar pessoas excluídas, que são minoria. A Etnografia é a ciência que tem como objeto
de estudo os costumes e tradições das etnias.
Como a maioria dos conceitos, o de raça tem seu campo
semântico e uma dimensão temporal e especial. No latim medieval, o conceito de
raça passou a designar a descendência, a linhagem, ou seja, um grupo de pessoa
que têm um ancestral comum e que, ipso facto, possuem algumas características
físicas em comum. Em 1684, o francês François Bernier emprega o termo no
sentido moderno da palavra, para classificar a diversidade humana em grupos
fisicamente contrastados, denominados raças. Nos séculos XVI-XVII, o conceito
de raça passa efetivamente a atuar nas relações entre classes sociais da França
da época, pois utilizado pela nobreza local que si identificava com os Francos,
de origem germânica em oposição ao Gauleses, população local identificada com a
Plebe. Não apenas os Francos se considerava como uma raça distinta dos
Gauleses, mais do que isso, eles se consideravam dotados de sangue “puro”,
insinuando suas habilidades especiais e aptidões naturais para dirigir,
administrar e dominar os Gauleses, que segundo pensavam, podiam até ser
escravizados. Percebe-se como o conceito de raças “puras” foi transportado da
Botânica e da Zoologia para legitimar as relações de dominação e de sujeição
entre classes sociais (Nobreza e Plebe), sem que houvessem diferenças
morfo-biológicas notáveis entre os indivíduos pertencentes a ambas as classes.
Invalidação científica do conceito de raça não
significa que todos os indivíduos ou todas as populações sejam geneticamente
semelhantes. Os patrimônios genéticos são diferentes, mas essas diferenças não
são suficientes para classificá-las em raças. O maior problema não está nem na
classificação como tal, nem na inoperacionalidade científica do conceito de
raça. Se os naturalistas dos séculos XVIII-XIX tivessem limitado seus trabalhos
somente à classificação dos grupos humanos em função das características
físicas, eles não teriam certamente causado nenhum problema à humanidade.
Alguns biólogos anti-racistas chegaram até sugerir que o
conceito de raça fosse banido dos dicionários e dos textos científicos. No
entanto, o conceito persiste tanto no uso popular como em trabalhos e estudos
produzidos na área das ciências sociais. Estes, embora concordem com as
conclusões da atual Biologia Humana sobre a inexistência científica da raça e a
inoperacionalidade do próprio conceito, eles justificam o uso do conceito como
realidade social e política, considerando a raça como uma construção
sociológica e uma categoria social de dominação e de exclusão.
O conteúdo da raça é morfo-biológico e o da etnia é
sócio-cultural, histórico e psicológico. Um conjunto populacional dito raça
“branca”, “negra” e “amarela”, pode conter em seu seio diversas etnias. Uma
etnia é um conjunto de indivíduos que, histórica ou mitologicamente, têm um
ancestral comum; têm uma língua em comum, uma mesma religião ou cosmovisão; uma
mesma cultura e moram geograficamente num mesmo território. Algumas etnias
constituíram sozinhas nações. Assim o caso de várias sociedades indígenas
brasileiras, africanas, asiáticas, australianas, entre varias outras, que são ou foram etnias nações. Sem dúvida,
por uma visão político-ideológica que colocou coletivamente os brancos no topo
da pirâmide social, do comando e do poder, independentemente de suas raízes
culturais de origem étnica, tem-se tendência, por vício da ideologia racista
que estabelece uma relação intrínseca entre biologia e cultura ou raça e
cultura, a considerar a população branca, independentemente de suas diferentes
origens geográficos e culturais, como pertencente a uma mesma cultura ou mesma
etnia, daí as expressões equívocas e equivocadas de “cultura branca” e “etnia
branca”. Pelo mesmo raciocínio baseado na visão político-ideológica que colocou
coletivamente os negros na base da pirâmide como grupo Têm-se culturas
particulares que escapam da cultura globalizada e se posicionam até como
resistência ao processo de globalização. Essas culturas particulares se
constroem diversamente tanto no conjunto da população negra como no da população
branca, oriental e indígenas, nativas. É a partir da tomada de consciência
dessas culturas de resistência que se constroem as identidades culturais
enquanto processos e jamais produtos acabados. São essas identidades plurais
que evocam as calorosas discussões sobre a identidade nacional e a introdução
do multiculturalismo numa educação-cidadã, Olhando a distribuição geográfica do Brasil e
sua realidade etnográfica, percebe-se que não existe uma única cultura branca e
uma única cultura negra e que regionalmente podemos distinguir diversas
culturas no Brasil. Neste sentido, os afro-baianos produzem no campo da
religiosidade, da música, da culinária, da dança, das artes plásticas, uma
cultura diferente dos afromineiros, dos afro-maranhenses e dos negros cariocas.
As comunidades quilombolas ou remanescentes dos quilombos, apesar de terem
alguns problemas comuns, apresentam também histórias, culturas e religiões
diferentes. Os descendentes de italianos em todo o Brasil preservaram alguns
hábitos alimentares que os aproximam da terra mãe; os gaúchos no Rio Grande do
Sul têm também peculiaridades culturais na sua dança, em seu traje e em seus
hábitos alimentares e culinários que os diferenciam dos baianos, etc. Como a
identidade cultural se construí com base na tomada de consciência das
diferenças provindo das particularidades históricas, culturais, religiosas,
sociais, regionais, etc. se delineiam assim no Brasil diversos processos de
identidade cultural, revelando um certo pluralismo tanto entre negros, quanto
entre brancos e entre amarelos, todos tomados como sujeitos históricos e
culturais e não como sujeitos biológicos ou raciais. “identidade étnico-racial
negra”. A questão é saber se todos têm consciência do conteúdo político dessas
expressões e evitam cair no biologismo, pensando que os negros produzem cultura
e identidade negras como as laranjeiras produzem laranjas e as mangueiras as
mangas. Esta identidade política é uma identidade unificadora em busca de
propostas transformadoras da realidade do negro no Brasil. Ela se opõe a uma
outra identidade unificadora proposta pela ideologia dominante, ou seja, a
identidade mestiça, que além de buscar a unidade nacional visa também a
legitimação da chamada democracia racial brasileira e a conservação do status
quo.
“Estamos convencidos
de que o racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata
revelam-se de maneira diferenciada para mulheres e meninas, e podem estar entre
os fatores que levam a uma deterioração de condição de vida, à pobreza, à
violência, às múltiplas formas de discriminação e à limitação ou negação de
seus direitos humanos...”
Declaração de Durban,
parágrafo 69.
Outra perspectiva
conceitual e o conceito de Racismo Institucional aponta para as formas como o
racismo participa das ações coletivas e como as instituições públicas e
privadas se organizam para responder aos interesses do grupo “racial”
dominante,ao mesmo tempo em que buscam subjugar aqueles grupos ditos
inferiores. Desse modo, o racismo pode estar inserido nos objetivos, nos modos
de funcionamento e nos resultados das políticas públicas. Compreender o
significado de racismo institucional ajuda a visualizar um aspecto do racismo
que se coloca além e em torno das relações e violências interpessoais. Criado e
disseminado pelos ativistas integrantes do grupo Panteras Negras Stokely Carmichael
e Charles Hamilton em 1967, o conceito de racismo institucional destaca a dimensão
não individualizada do racismo.
A falha coletiva de
uma organização emprover um serviço apropriado e profissional às pessoas por
causa de sua cor, cultura ou origem étnica. (Carmichael, S. e Hamilton, C. Black power: the politics of liberation
in América. New
York: Vintage, 1967, p. 4).
Pessoas e
organizações que se beneficiam do racismo institucional são
refratárias a mudanças voluntárias do status
quo. (King, Gary. Institutional Racism and the
Medical/Health Complex: a conceptual analysis, p. 33). A respeito da
concepção de raça, Donna Haraway (1997) indica que sua construção conceitual e
categórica sempre se estabeleceu de forma bastante problemática. De acordo com
a pensadora, raça faz parte daquele rol de conceitos que indubitavelmente levam
ao desconforto a quem os utiliza. O caráter instável e, por vezes,
desestabilizador de seu conteúdo coloca esta ideia no mesmo conjunto de outras de
também difícil emprego, como sexo ou natureza. A imprecisão entre suas
realidades natural ou histórica, real ou imaginária, determinante ou
determinada, insiste em gerar um incômodo em seus usos. Como sexo e natureza,
raça toca de maneira tensionante em instituições e paradigmas tão imaculados em
nosso sistema social que aceitar ou negar tais noções como entidades pode
colocar em xeque grande parte dos elementos estruturadores de nossa vida
social. Nação, família e humanidade são parte destas instituições e paradigmas
que estremecem ao mais simples vibrar da raça, do sexo ou da natureza. Percebemos
então que a luta e a resiliencia apenas começaram no Brasil onde a jovialidade
da política afirmativa e reparadora se faz constantemente necessária diante de
fatos e narrativas constantes de um racismo e preconceito velado constantes ainda
em nossa terra Brasil e por muitas outras em referencia.
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